domingo, 31 de agosto de 2008

Fleet Foxes

Lembra daquela história de rock rural? Pois bem, o Fleet Foxes passeia por esse campo. E com perfeição.
A banda é formada por 5 caras de Seattle, terra do Nirvana e do indefectível grunge, lança pelo Sub pop, mas segue uma linha completamente oposta. Ao invés do tédio dilacerante e da angustia do fim da infância, da necessidade de encarar uma vida de responsabilidades e problemas, aqui predomina uma busca pelo desejo de quietude e paz. Uma fuga da realidade tecnológica massacrante para um mundo idealisticamente rural. Como diria, ironicamente, o Husker Du: zen-arcade. O bucolismo de músicas emblemáticas como “Meadowlarks”, “Tiger Montain Pesant Song” e até mesmo “English House” (do ep de estréia da banda “Sun Giant”) deixam isso bem claro. O folk é a pedra fundamental na construção desse som. Uma contextura sonora delicada que nos transporta para esse universo campestre onde a banda escolheu se refugiar.
O “sol oscilante na limpidez dourada do céu” de que eles falam na faixa de abertura do disco, “Sun it Rises”, se traduz na trama dos violões dedilhados com apuro e cuidado. Echos de Byrds, Fairport Convention, Love, Simon & Garfunkel, Joni Mitchell, Crosby Stills & Nash, Buffalo Springfield, Neil Young e Beach Boys são ouvidos em todas as musicas. A esse universo folk dos anos 60 e 70, influências assumidas pelos integrantes - que dizem ter crescido ouvindo os discos dos pais - a banda acrescenta ainda sonoridades que remontam à música medieval. Essa, aliás, foi a primeira coisa que me chocou positivamente no som do Fleet Foxes. E a pintura de Pieter Bruegel na capa do disco deixa bem clara essa influência. Se todo esse escapismo pode parecer numa primeira leitura com sintoma de um hippismo tardio, na prática se converte numa posição clara dos caras de demarcar seu espaço a partir de suas influências sem mascará-las com pretensas doses de modernismo. Algo bastante incomum na cena hoje em dia - principalmente após a ascensão do “eletroindie”.
O cd atinge o seu ápice numa sequência matadora de músicas belíssimas, que começa com a já citada “Tiger Mountain...”, “Quiet Houses” - onde percebo ecos de Clube da Esquina e da cena mineira dos anos 70 - e “He Doesn’t Know Why”. Mas tem mais. Tem a delicadeza instrumental de “Heard Them Stirring”, o lamento de “Your Protector” e o universo ‘blackbyrdiano’ a La Beatles de “Meadowlarks”. Os vocais harmonizam com perfeição e virtuosismo raros em bandas de rock atuais transformando a audição em uma experiência quase gospel.
Com apenas 2 lançamentos, talvez ainda seja cedo para dizer, mas o Fleet Foxes parece bastante empenhado em construir um interessante ponto de fuga dentro do beco sem saída em que transformou o folk. Pode acreditar.

Para ouvir:
http://www.myspace.com/fleetfoxes

Para conhecer mais:
http://www.subpop.com/bio/fleet_foxes

Para baixar:
http://www.mininova.org/
http://thepiratebay.org/

sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Flying Lotus - Los Angeles

Não conhecia o Flying Lotus. Faz pouco tempo que fomos apresentados. Mas de uma coisa pode ter certeza: capturar minha atenção sonora com tanta rapidez não é tarefa fácil. Mas ele conseguiu.
Primeiro vamos às devidas apresentações. Um pouco que sei sobre o cara por trás do projeto. Seu nome é Steven Ellison, mora em Winnetka, Califórnia, e é sobrinho de Alice Coltrane - esposa, colaboradora e guardiã do legado do Coltrane que você deve estar imaginando, o John, gênio do jazz que dispensa apresentações. Para sobreviver Steve se vira como DJ e já fez muita trilha - a maioria não creditada a ele - para o divertido cartoon Adult Swim.
Flying Lotus se define como produtor de hip hop, mas sua musicalidade vai além, muito além. Incorporando à carga genética do jazz que traz no sangue, o funk e r&b dos anos 70, o experimentalismo abstrato do IDM, as visões de futurismos nublados do muzak pop dos anos 60 e, claro, os fundamentos do mais underground hip hop, pois sem ele a coisa não funcionaria. O som resultante dessa gama de influências cabe perfeito sob o rótulo (de qualidade, diga-se) Warp, uma das mais prestigiadas gravadoras independentes do mundo. Na estante da sua casa dedicada ao selo - ah, vai, toda casa tem uma...- , seus discos poderiam figurar ao lado dos Profuse 73, Nightmares on Wax, Jamie Lidell e, até mesmo, nos momentos de ambiências mais pastorais, Boards of Canadá. Também é bastante associado aos igualmente underground hips Madlib e J Dilla.
O seu mais novo lançamento chama-se Los Angeles, e junto com o seu cd sua estréia 1983 (2006) e os eps Reset (2007) e L.A Ep 1x3 (2008) compõem a sua discografia.
Em Los Angeles, Flyin Lótus aprofunda as experimentações do 1983. Seus teclados soam ainda mais viajantes e os seus samplers pouco orgânicos são distorcidos até alcançarem uma certa dramaticidade musical. O resultado, ao contrário do que se possa imaginar pela descrição, é belo. Surpreendente e de uma leveza capaz de sensibilizar uma alma cansada e musicalmente cética, como a minha...
O disco abre com a climatologia em alta rotação de faixas como “Brainfeeder” e “Breath . Something/ Sellar Star”. A partir daí arquitetura sonora vai sendo manufaturada gradual e cuidadosamente para que você seja absorvido por esse universo de sons envolventes e misteriosos. Para quem já conhece, as comparações com os momentos mais instigantes do Profuse 73 são inevitáveis. O universo rítmico que gerou o artista ganha corpo em faixas como “Melt!” e “Comet Course”. A primeira mais tribal, a segunda jazzy e sincopada. Beats sintéticos e texturas oníricas sobressaem ainda mais em “Golden Godiva”. Fluxo musical. Chiados de vinil antigo e frequências de rádios mal sinalizadas, como se captadas de um espaço distante, perpassam a maioria das faixas. Pela minha leitura soam como lembranças de fundamentos do hip hop old school os chiados. As freqüências mal sintonizadas remetem ao estado atual das nossas rádios num dial infectado e dominado por tanto lixo musical. Na sequência, o popismo cerebral de “Parisian Goldfish” surge encantador, calorento, dançante e perfeito até para uma disputada roda de break – underground!
O disco fecha com a sutileza jazzy, noturna, de “Testament” evocando uma Billie Holiday ambígua nos vocais de Gonja Sufi e o singelo lulaby de “Autie’s Lock/ Infinito”. Depois disso, o som evapora, o silêncio toma conta, mas aí, sorry, você já foi capturado. Flaying Lotus. Vale muito a pena conhecer.

Para ouvir:
http://www.myspace.com/flyinglotus

Para conhecer mais e jogar:
http://www.flying-lotus.com/destroy/